Resistência cultural na Guiné-Bissau: o gumbe

Partindo do pressuposto segundo o qual uma das “técnicas” coloniais se baseia no sufocamento da cultura autóctone para a implantação da do colonizador, Amílcar Cabral entende que uma forma de resistência essencial para a libertação assenta na própria cultura e na recuperação dos valores originais, por parte do povo. É nesse sentido, que o gumbe, na Guiné-Bissau, representa o espaço de manifestação da cultura autóctone, antes silenciada pelos colonizadores. O gumbe, enquanto elo entre pessoas que pertencem à mesma cultura e que falam a mesma língua, serve de instrumento da reformulação identitária do povo, através da música, que se torna uma forma de negociar novas identidades e novas formas de existência colectiva. Ademais, o gumbe, por recorrer inteiramente ao crioulo, detém um papel importante no âmbito da discussão linguístico-identitária. Apesar de o fenómeno da crioulização ser impulsionado pela chegada do colonizador, o resultado deste processo criativo é surpreendente. A língua que lhe resulta é a expressão de uma identidade renovada que, apesar das ligações óbvias com a língua do colonizador, é frequentemente utilizada como forma de manifestação anti-colonial, não estando a sua compreensão acessível aos “estrangeiros”. Neste sentido, o gumbe parece ser o emblema do processo de crioulização e um dos símbolos da resistência cultural que levou à libertação da Guiné-Bissau.

Laura Antonini, ISCTE-IUL


 

Doutoranda em Estudos Africanos (ISCTE-IUL, Lisboa), Mestre em Línguas e Literaturas Estrangeiras (UNISA, Salerno)