“Corno de mulata dói mais que morte de mãe”

A primeira vez que ouvi esta expressão demorei alguns minutos a perceber o seu alcance. Ela confirmou, contudo, uma suspeita minha. As mulatas como objecto de desejo mas também como alvo de preconceito e desconfiança. Eu cresci em Luanda numa cidade marcada pelo ritmo do partido único, do recolher obrigatório e dos cartões de abastecimento. Não sei se por ser muito nova não me apercebi ou se por estarem todos muito ocupados a sobreviver não havia tempo para discutir o legado do colonialismo no que concerne à raça ou à classes sociais. Hoje a situação é bem diferente e a jovem nação angolana começa a expor as suas fragilidades, quer ao reiterar repetidamente a sua identidade quer na necessidade de tornar essa angolanidade pedagógica e prescritiva. Esta apresentação propõe-se, com recurso a notas pessoais e etnográficas, questionar o trajeto da construção da nação angolana e o projeto pós independência de construção da Nação Angolana, o ideal do “Homem Novo” e “Um só povo, Uma só nação” ambos enunciados no hino nacional de 1975. As notas pessoais surgem da análise da figura da mulata, figura que ao longo da história foi objecto de atração e repulsa mantendo um estatuto de alteridade e ambiguidade. Traremos para análise expressões populares do português de Luanda e outros elementos de cultura popular.

Suzana Sousa, ISCTE-IUL


 

Licenciada em Estudos Artísticos, variante Artes e Culturas Comparadas pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Mestre em Estudos Culturais pelo Goldsmiths College, Universidade de Londres. Doutoranda em Antropologia no ISCTE-IUL. Tenho desenvolvido pesquisa na área das políticas culturais e trabalhado como curadora e crítica de arte. Atualmente sou a curadora da sala de exposições temporárias do Pavilhão de Angola na ExpoMilano 2015 com o projecto Seeds of Memory.